Estreia
hoje nas salas de cinemas de Fortaleza a primeira parte do mais novo trabalho
de Lars Von Trier. O Diretor Fantasma já deu uma olhada no filme e adianta um
pouco dessa história dicotômica.
Com uma campanha publicitária
extremamente eficaz, Ninfomaníaca Volume
I se tornou uma das estréias mais esperada por muitos em 2014. As atenções
para o filme começaram quando Trier confirmou Charlotte Gainsbourg para o
elenco e logo depois comentou a participação de atores pornôs em seu novo
filme. Depois disso foi divulgada a primeira imagem do filme em que Gainsbourg
aparece deitada em um beco, o que seria o começo de toda a história. A partir
daí foi anunciado a divisão do filme em duas partes e suas longas durações.
No fim do ano passado uma sequência
de trailers com recortes de cada capítulo da história do filme completou toda
atmosfera a se esperar da projeção. Tudo isso, é claro, tomou conta dos portais
de cinema e das redes sociais. A todo o momento saiam vídeos e cartazes
altamente sugestivos ao sexo e à luxuria.
Foi afirmado também que o filme teria a duração de
um pouco mais de 5 horas para as cópias exibidas em festivais. Já para o
circuito comercial, as genéricas cópias de 2 horas seriam exibidas com cortes
das cenas explícitas de sexo. A princípio, o que se pode ver nessas duas horas
é uma sinfonia de grandes imagens e atuações.
Juntando
esses pilares com uma história biográfica de uma ninfomaníaca, contada da
maneira Trier, é de se esperar um tapa na cara sem pedido de desculpas, que
você vai adorar levar. Joe (Charlotte Gainsbourg) é encontrada por um judeu chamado Seligman (Stellan Skarsgaard), que é apaixonado por Johann Sebastian Bach e Edgar Alan Poe, em um
beco após ser brutalmente espancada. Ele a leva para o seu apartamento e Joe resolve contar
toda a sua vida sexual, desde que nasceu até o então momento. Seligman acomoda
Joe em um quarto que parece servir de depósito de quadros e outros equipamentos.
Deitada em uma cama e com várias xícaras de chá os dois passam um bom tempo
conversando sobre a vida de Joe.
O velho Seligman
é um homem solitário que conhece muito de história e artes, ele é daquele tipo
de gente que cria teorias para os comportamentos das outras pessoas - de tanto
ficar pensando sozinho -, como alegar que destros que começam a cortar as unhas
pela mão esquerda são mais felizes do que os que começam pela mão direita.
Apesar de ser o ouvite de Joe o filme inteiro o personagem não é esquecido na
história, sua presença está em absorver todas as promiscuidades (em seu ponto
de vista conservador) e absurdos vindos da ninfomaníaca. Se não fosse por suas
objeções e questionamentos sobre o que Joe fazia, o espectador tomaria todas as
experiências e convicções da personagem sem muitas objeções. Seligman tem uma
função detalhista de descobrir em Joe suas motivações e esclarecer ao publico
como pensa a protagonista, além de também colocar em ótimos questionamentos a
finalidade do amor. Com tudo isso há também impresso no velho personagem uma
alavanca (representação do olhar genérico do mundo) que puxa as histórias
perfeitamente normais no ponto de vista da Joe, para um lugar em que existe
convenções sociais e ideológicas de uma sociedade universal que as tornam
inescrupulosas. Não que o personagem repudie os pensamentos e ações de Joe,
pelo contrário, ele se mostra altamente atencioso e interessado ao modo de
pensar da mulher.
Já Joe, nesta primeira parte é
apresentada em sua época mais jovem, mostrando o início de tudo. Com o rosto
coberto de hematomas, ela conta todas as suas histórias e experiências deitada
numa cama sem se importar com o que Seligman pense. É de se perceber que para a
personagem tanto faz contar ou não, mas com o passar da história ela vai se
empolgando e achando divertido passar o tempo contando sua vida. A naturalidade
para os detalhes é tamanha que podemos equiparar com uma pessoa que relata sua
vida pessoal em que estão inseridos todos os causos banais de uma pessoa comum,
família, trabalho, casamento, filhos, divórcio etc. É como se a vida de Joe fosse
tão banal quanto a de qualquer outro indivíduo. A atuação de Gainsbourg fazendo Joe mais velha, com 50 anos, é essencial. O tédio e
convicção estão estampados em seu rosto. Já atriz Stacy Martin também segura a personagem, quando mais nova, de
um modo angelical.
Apesar de ser a “viciada em sexo na história”, Joe
possui uma razão por querer continuar sendo assim. Desde pequena até sua
juventude ela foi criada em um ambiente que lhe exigia pudor e obediências. É
filha de um médico apaixonado por botânica e sempre aderiu a métodos bem
pragmáticos para entender a vida e as interações sociais (talvez por isso sua
vontade de descobrir o “proibido” seja ainda mais aguçada). Toda a sua
teorização é tamanha ao ponto de questionar a finalidade do amor e todas as
influências sociais que favorecem o terreno dos relacionamentos e o romance.
Para Joe, o amor é apenas ciúmes e luxúria. Isso que complica tudo, pois a real
finalidade das relações “amorosas” é o sexo, e para ela esse início poderia ser
pulado. A personagem para de ser tão pragmática quando se permite entender a
ordem do caos, quando vira secretária em uma gráfica e convive com a bagunça
(caos) da mesa de seu chefe (ordem), do qual começa a se sentir atraída de
maneira diferente.
O filme é dividido em oito capítulos, como em um
livro, as narrações também possuem um tom literário. Por todo o filme o estilo documental
de câmera é extremamente majestoso
(incluindo a pegada histórica de Trier de colocar religião, ideologia, ciências
e astronomia envolvendo a base dos pensamentos dos personagens), é incrível a
qualidade de captação dos pequenos gestos e ações dos personagens que tomam
formas e proporções diferentes de acordo com o enquadramento e corridas de
câmera. É um vislumbro a quantidade de belas cenas e a textura apassivadora,
quase angelical, de toda pornografia soft que rodeia a história.
Para quem espera muito sexo explícito, como
prometem os anúncios do filme, vai ficar um pouco desapontado, pois nessas duas
horas de Ninfomaníaca Volume I o que
sobrepõe é a maneira que Joe enxerga as coisas, o que ela pensa e como ela
reage ao que vai acontecendo em sua vida. Esse recorte inicial de sua vida
quando mais jovem é um grande espetáculo peculiar de como se constrói uma
ninfomaníaca. Terminada a sessão, provavelmente muita gente sairá pedindo mais
por conta da fluidez que a história tem. A dinâmica visual é tão competente que
transforma toda a história em um pequeno conto ingênuo, em que a protagonista é
uma jovem perdida que sabe o que quer e não se preocupa em encontrar o seu
lugar ideal. O que perfeitamente pode sustentar uma sessão de 5 horas e alguns
minutos nos festivais. A primeira parada que a versão de cinco horas fará será
em no Festival de Berlim, que acontecerá em fevereiro.
Uma das questões a ser levantada no final do filme
é se sabemos o que é o amor em sua forma original, se é que existe. Uma
descoberta no sentido trivial da coisa, pois desde novos nos deparamos com
influências e determinismos de que há um sentimento que todas as pessoas
procuram para serem felizes, e essa “campanha” externa sobre nós acaba se
tornando algo genérico e banal em nossa vida, se transformando em mais um
paradigma de etiqueta como ter um emprego e construir uma família. Essa
construção ainda romântica do amor que se prolonga nos tempos se choca com a
praticidade equacional de Joe, o que nos faz refletir se realmente sentimos
amor “de verdade” ou se vamos senti-lo em nossa vida, já que as construções e
analogias que adquirimos são exemplos externos a nós, e como saber
identificá-lo quando ele aparecer? Eis a equação e a dicotomia: O amor é o
ingrediente secreto?
NINFOMANÍACA VOLUME I
Nymphomaniac Volume I.
2013. Cor. 122min. Dinamarca, Alemanha, França, Bélgica, Inglaterra.
Drama/Erótico. Direção: Lars Von Trier. Roteiro: Lars Von Trier. Elenco: Charlotte Gainsbourg, Stellan Skarsgard,
Stacy Martin, Um Thurman, Shia LaBeouf, Christian Slater, Connie Nielsen.
SALA 02
10/01: 16h – 18h20 – 20h30
11/01: 16h – 18h20 – 20h30
12/01: 15h20 – 17h40 – 20h
14/01: 15h20 – 17h40 – 20h
15/01: 16h – 18h20 – 20h30
16/01: 16h – 18h20 – 20h30
11/01: 16h – 18h20 – 20h30
12/01: 15h20 – 17h40 – 20h
14/01: 15h20 – 17h40 – 20h
15/01: 16h – 18h20 – 20h30
16/01: 16h – 18h20 – 20h30
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